Fé, Fronteiras e a Tragédia em Sentinela do Norte


O aclamado diretor Justin Lin, conhecido por seu trabalho na franquia de Velozes e Furiosos, regressa às suas raízes no cinema independente com Last Days, um drama biográfico que mergulha na controversa e trágica história do missionário americano John Allen Chau. O longa-metragem dramatiza os eventos que culminaram na morte de Chau, em 2018, na Ilha Sentinela do Norte, um dos locais mais isolados do planeta, habitado por uma tribo não contatada que rejeita veementemente qualquer intrusão.

Com estreia prevista para breve, o filme, baseado no extenso artigo "Os Últimos Dias de John Allen Chau", de Alex Perry, para a Outside Magazine, oferece uma visão multifacetada e humana da jornada de Chau. A narrativa acompanha o missionário desde seus tempos na Universidade Oral Roberts até sua preparação com o grupo All Nations para levar o Evangelho aos sentineleses, a quem ele, em seus diários, referiu-se como "a última fortaleza de Satanás".

A Busca por Humanidade em uma Figura Controversa

O ponto de partida para Lin foi um impacto pessoal. Ao ver a notícia da morte de Chau no saguão de um aeroporto, o diretor inicialmente o descartou, mas foi surpreendido ao ver o rosto de um jovem sino-americano. Essa imagem desencadeou uma reação profunda: "Aquele é o filho de alguém... Quem sou eu para julgá-lo ou descartá-lo em 20 segundos?". Esse sentimento de empatia motivou um desenvolvimento criativo de três anos, com o objetivo de buscar um "retrato humano" de John Allen Chau (interpretado por Sky Yang).

A obra explora as complexas camadas do protagonista: um jovem formado, aventureiro, criado em um lar cristão afetuoso (seus pais são interpretados por Ken Leung e Claire Price) e, ao mesmo tempo, impulsionado por uma convicção missionária inabalável que o levou a ignorar as leis indianas e os riscos éticos e sanitários de contatar um povo isolado.

Múltiplas Visões e o Debate Ético

O roteiro, assinado por Ben Ripley, se estrutura para ir além do julgamento, apresentando "múltiplas visões", incluindo a da oficial indiana Meera (Radhika Apte), que tenta elucidar as últimas horas de Chau. Lin descreve o filme como algo que "começa quase como um procedimento, mas depois se abre para algo maior... não para julgar, mas para conectar."

Um dos focos sensíveis do filme é a dor e culpa do pai de John, um psiquiatra cristão que, como revelado no artigo de Perry, chegou a culpar o "cristianismo extremo" pela morte do filho.

O filme também resgata o debate público que se seguiu à tragédia:

  1. Riscos do Evangelismo Moderno: A produção dialoga com a crítica levantada por outros trabalhos, como o documentário The Mission da National Geographic, sobre os riscos do evangelismo descontrolado a povos isolados, cujo sistema imunológico é vulnerável a doenças do mundo exterior.

  2. A Centralidade da Missão: Em contraponto, a obra reflete a perspectiva de figuras como Jaime Saint, neto do missionário Nate Saint, que defende a primazia da Grande Comissão, afirmando que a medida do sucesso cristão é a "obediência".

Lin, embora não seja cristão, abordou a fé com reverência, influenciado por sua vivência: "O que aprendi... foi decência, respeito, gentileza." Para ele, o propósito do filme não é responder se Chau estava certo ou errado, mas sim questionar: "Eu queria perguntar por quê."

Linguagem Cinematográfica: Aventura e Tragédia

Ao examinar os diários de John Chau, o diretor identificou as marcas de aventura na autoimagem do missionário, que era influenciado por figuras literárias e histórias como as de Robinson Crusoé e O Fim da Lança. Lin optou por usar "a mesma linguagem cinematográfica que o inspirou," combinando aventura e odisseia espiritual. O resultado é um drama que se apropria de recursos narrativos familiares para tentar aproximar o público da complexa humanidade do protagonista.

Com Last Days, Justin Lin espera estimular um diálogo construtivo. Conforme declarado em entrevista ao The Christian Post, o diretor busca "conectar pessoas de origens muito diferentes", construindo pontes onde antes existia apenas julgamento sobre um evento que abalou as noções de missão, fronteira e respeito a culturas isoladas no século XXI.


Fonte: The Christian Post

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